sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Em Filus é Assim...

Arísia Barros (*)

Filus fica localizada no município de Santana do Mundaú e recentemente foi reconhecida pela União como comunidade de remanescentes quilombolas. O estado de Alagoas agora possui 23 registros de comunidades reconhecidas.

Em Filús é assim: a mesma água que os moradores banham os animais e a mesma água com a qual lavam as roupas que por sua vez é a mesma que usam para matar a sede e se alimentam. Condições precárias de higiene, sujeitos a epidemias, ou a pandemia do descaso institucional. Em Filús enxergamos a brecha-temporal entre 1888 e as muitas possibilidades de inclusão étnica-história do povo quilombola.

A realidade dos viventes de Filús nos lembra Vidas Secas de Graciliano: é uma realidade nua, crua e seca. Para chegar à Filús é preciso “comer” muita poeira, a água que deveria escorrer por entre as torneiras, escorre por entre os dedos de seus moradores, como uma metafora mortífera. Não há recursos para investimento nas terras agora reconhecidas. Dos casamentos consanguíneos entre negros Filus ganha uma população diferenciada de albinos. Nove albinos com câncer de pele.

O silêncio minimilista em relação às condições subhumanas da população de Filus é a celebração do racismo contemporâneo. Em Filus encontramos pessoas que na ausência de políticas públicas, vivem o horror da herança escravatura, mas,ousam se vestir de suas biografias de enorme importância histórica e insistem...

Políticas públicas eficazes e eficientes contribuírão sobremaneira para a produção do auto-conhecimento identitário, o fomento ao debate e a superação do racismo institucional, das discriminações e das desigualdades raciais, mudarão o “status quo” da população quilombola moradora de Filús.

Em Filus 70% da população residente tem esquistosomose devido a precariedade da água que consome e de quase nenhuma política pública. O olho do poder público para Filus é fechado e pobre. O IDH Índice de Desenvolvimento Humano, em Filus é palavrão!

Em Filus é muito grande o analfabetismo entre a minúscula população residente , constituída de 40 famílias que se agiganta no cotidiano exercício identitário do ser. Ser pessoa, não o homem-bicho ou o bicho-homem que tão bem retratou Drummond,em sua indignação de poeta.

Na verdade Filus é uma grande gaiola social ondem convivem a brutalidade da superficialidade vazia de políticas públicas- e o descaso em relação a importância e a historicidade da população negra brasileira.

Estabelecimento de estratégias de curto, médio e longo prazo trarão dignidade à história e ao cotidiano dos remanescentes quilombolas, protagonistas da valiosa contação de histórias sobre a construção do Brasil, como nação multicultural, do líder Zumbi dos Palmares e toda ancestralidade negra.


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(*) Co-autora da Lei Estadual nº6.814/07. Consultora para aplicabilidade das políticas educacionais para uma pedagogia anti-racista: Lei Estadual nº 6.814/07 e Lei Federal nº 10.639/03. Coordenadora do Projeto Raízes de África (ONG Maria Mariá), Professora, Redatora Publicitária e autora do livro: A Pequena África chamada Alagoas.
e-mail: negrasnoticias@yahoo.com.br

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