domingo, 27 de novembro de 2011

Cabelo bom, sim senhor!

Brasil vive o auge do racismo, onde o preconceito contra o cabelo crespo agride mulheres de todas as idades



Texto: Emanuelle Vanderlei - Jornalista
Fotos: Helciane Angélica - Jornalista


 
Carolina é uma menina negra, tem 12 anos e já sonha com uma escova progressiva. Perguntada pela mãe sobre os motivos ela explica: “Eu queria ficar mais bonita. A dona Graça (pessoa que faz o transporte escolar) disse que as outras meninas de cabelo ‘fuará,’ igual ao meu, fizeram e ficaram ótimas”. Carol, nem entende direito, mas já tenta negar sua identidade para fugir de uma das heranças mais malditas que o Brasil ainda preserva: o racismo.

Apesar de pouca gente assumir o preconceito racial que ainda guarda dentro de si, a manifestação contra o cabelo crespo é livre, aceita como se fosse natural. É comum ouvirmos as pessoas classificarem o cabelo, dizendo que “fulana tem o cabelo ruim”.

Nessa sociedade preconceituosa, o padrão de beleza criado e imposto pela mídia ultrapassa os limites do bom senso. Hoje, mães submetem crianças cada vez mais novas a procedimentos químicos agressivos, colocando em risco a saúde de suas filhas, tudo para negar a identidade mais forte da origem da população brasileira.

A resistência à mudança muitas vezes é vista como desleixo, falta de vaidade. E isso influencia em tudo, é preciso carregar o tempo todo, até mesmo em uma seleção de emprego. Na contramão disso, há quem resista, enfrente o racismo com criatividade e exibe orgulhosa o visual afro. E a beleza da diversidade continua colorindo o país.
O blog Cabelo crespo é cabelo bom (www.cabelocrespoecabelobom.com.br), da jornalista Mariangela Miguel, surgiu de uma indignação, como afirma a descrição dela própria: “Depois de tantos anos ouvindo (e eu mesma afirmando!) que meu cabelo é ruim, que cabelo crespo é ruim, que fulana tem cabelo ruim, cansei. É verdade que nunca gostei de cabelos lisos, não combina comigo. Mas os cabelos cacheados sempre me provocaram suspiros. Tentei de tudo, chapinha, relaxamento, mas é obvio que os cachos nunca ficaram perfeitos. É claro que na adolescência a frustração é maior. Quem não quer ter o cabelo da moda? Quando o seu cabelo só cresce para cima, como explicar para uma menina de 13 anos que ela não pode nem sonhar com o cabelo Chanel? Quem é o culpado? O cabelo ruim. Acreditei nisso por muitos anos. Hoje, depois de tantas experiências (que vou fazer questão de contar cada uma para vocês), cheguei a seguinte conclusão: se meu cabelo fosse realmente ruim, não teria aguentado tanto secador, chapinha e química”.
O depoimento de Mariangela descreve o sentimento de milhares de brasileiras. Como se sabe, a maior parte da população é negra e tem o cabelo crespo. A maioria não acha seu cabelo bonito, porque passou a vida inteira ouvindo que o bonito é o cabelo liso. Então é hora de desconstruir esses conceitos, lembrar que o racismo é inaceitável em qualquer que seja a sua forma de apresentação, e deixar que os cachinhos dominem o país. Não existe cabelo ruim, ruim é o preconceito.



Fonte: Encarte Afro AXÉ ESPECIAL - Jornal Tribuna Independente (20.11.11)

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