A Constituição Federal brasileira estabelece que é proibido à União, aos Estados ou Municípios cobrar impostos sobre templos religiosos de qualquer culto. No entanto, essa é uma prática não muito respeitada por alguns governantes municipais, que insistem em cobrar o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), principalmente, de templos religiosos de matriz africana.
A Câmara de Vereadores da cidade de Salvador, Bahia, debateu o direito de isenção do imposto a essas religiões. A vereadora Olívia Santana (PCdoB) é a autora da emenda ao Código Tributário do Município de Salvador que estende o benefício para os templos situados em terrenos arrendados. De acordo com a vereadora, a resolução beneficia principalmente os templos das religiões de matriz africana, pois cerca de 80% deles não usufruíam o benefício da isenção já alcançado por outras religiões, entre outros motivos, por estarem localizados em terrenos arrendados.
O templo religioso é o espaço físico, a edificação, a casa destinada ao culto, na qual são realizadas as cerimônias, práticas, ritos e deveres religiosos. Para funcionar legalmente, o templo necessita de alvará de funcionamento expedido pela Prefeitura do município onde esteja localizado. Apenas a Prefeitura pode expedir o alvará de funcionamento e nenhum outro documento o substitui. O documento deve ser requerido independente do imóvel ser próprio ou alugado.
A grande dificuldade das religiões de matriz africana obterem isenção do IPTU deve-se à falta de documentação e registro dos terreiros. Segundo levantamento feito pela Secretaria Municipal da Reparação de Salvador, cerca de dois mil terreiros de diversas nações foram encontrados no município, sendo que mais de 80% deles estão em situação fundiária irregular.
Muitas vezes falta estrutura jurídica para que os templos se constituam, pois muitos não possuem atas e estatutos registrados em cartório para que possam ser isentos do IPTU, conforme previsto na Constituição. A vereadora lembra que as instituições públicas devem se abrir para que todos tenham acesso. "As instituições sempre estiveram afastadas das religiões de matriz africana, agora elas devem se abrir para que todos possam ter a mesma oportunidade de acesso. Religiões como o candomblé, são formadas por pessoas de baixa renda, sem instrumentos legais necessários para obter informações e ter acesso ao aparato jurídico e advogados, como em outras religiões", afirma. E complementa: "Não se pode esquecer que essas religiões constituem a marca do povo brasileiro, com a sua afirmação de cidadania, mas ainda lidam com a carga do preconceito e do racismo, ainda carregam o peso do colonialismo e da escravidão".
O vice-prefeito soteropolitano, Edivaldo Brito, participou do debate na Câmara e se prontificou a colocar a Secretaria da Fazenda à disposição dos terreiros para o devido esclarecimento e cadastramento, a fim de agilizar o processo jna Prefeitura. Edivaldo lembrou que o tombamento de um terreiro significa proteção e respeito, não devendo ficar limitado apenas ao barracão, mas sim ampliado às demais áreas, normalmente zonas de matas.
Mas não só as questões jurídicas impedem a garantia do direito. O preconceito também é uma das maiores razões da recusa em se aceitar os terreiros como templos religiosos.
Reconhecimento histórico
Para o antropólogo Ordep Serra, pesquisador e professor da Universidade Federal da Bahia, "a dificuldade do processo de tombamento passa pelo reconhecimento histórico e pelo valor da religião de matriz africana. Os terreiros são símbolos culturais e devem tomar cuidado para não perderem suas áreas verdes por conta das forças econômicas".
O professor Ordep foi relator do processo de tombamento do Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho, Ilê Axé Iyá Nassô Oká, um dos mais antigos e conhecidos templos da Bahia. Na época, a Prefeitura de Salvador exigia o pagamento de uma dívida de mais de 800 mil reais por impostos vencidos, ameaçando levar a Casa para leilão. Contudo, após uma imensa mobilização da sociedade baiana e de órgãos não-governamentais, a Prefeitura acabou por reconhecer a imunidade tributária. O Terreiro da Casa Branca foi o primeiro templo afro-religioso a ser tombado como patrimônio histórico do Brasil.
A falta de conhecimento das leis é também um grave problema. Conforme explica Ricardo Barreira, presidente da Umbanda Fest, que acontece em Bauru, a falta de informação do povo de matriz africana é grande, pois muitos nem sabe que seus direitos são garantidos pela Constituição. Ele comenta: "Grande parte dos templos e sacerdotes não exercem seus direitos porque não sabe que eles existem. Todos os templos religiosos são isentos desse imposto. Em Bauru, nós temos cerca de 800 templos de umbanda e a maioria paga IPTU".
Outras cidades já possuem leis regulamentando a isenção de imposto para todas as religiões, algumas até ressaltando a inclusão de terreiros como templos sagrados.
O prefeito de Aracaju, Marcelo Déda, assinou em maio de 2002, o decreto municipal que isenta templos afro-religiosos da cobrança da taxa do Imposto Predial Territorial Urbano. "Esse decreto é, sobretudo, para aqueles que têm dificuldade, pela perseguição e preconceito, em praticar sua fé", afirmou na época. Déda lembrou que a isenção é estendida para outras religiões, como por exemplo, a espírita kardecista.
Em Manaus, o prefeito Serafim Corrêa assinou em 2007, decreto concedendo imunidade tributária aos templos religiosos,inclusive, aos imóveis alugados para qualquer religião.
Em São Paulo, a ex-prefeita Marta Suplicy realizou até cerimônia multirreligiosa, em 2004, reunindo líderes de várias denominações e cerca de 700 pessoas no Teatro Municipal, para assinar a sanção de uma lei que desburocratiza a isenção do IPTU a aposentados e templos religiosos em São Paulo.
Fonte: Informe Palmares - FCP
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