César Romero (Folha da Bahia)
Recentemente inaugurada na Praça da Sé, a escultura de Zumbi dos Palmares, criação de Marcia Magno, vem despertando a admiração de todos pela sua expressividade plástica e simbólica. A repercussão tem chamado atenção para a artista plástica, decoradora e professora da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia. Artista de longo currículo, a sua obra é bastante diversificada e conhecida nacionalmente, através de exposições individuais e coletivas. Já esteve presente em várias mostras internacionais e seu trabalho, é alvo de análise e elogio de renomados especialistas.
Artista da geração 70, tem sido notável a sua presença como professora de arte na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (Ufba), da qual foi diretora e responsável pela criação e implantação dos cursos de desenho industrial e superior de decoração. Na Ufba, também realizou vários murais de grande porte no campus universitário. Ensinando xilogravura, ainda fez parte do grupo de professores das Oficinas de Arte em Série do Museu de Arte Moderna da Bahia, criadas por Francisco Liberato e coordenadas por Juarez Paraíso (marido da artista), de 1980 a 1988.
Na área das artes plásticas, o destaque é para a sua produção de gravuras e, ultimamente, a utilização do computador. Como escultora, Marcia Magno tem se destacado na produção de inúmeras obras personalizadas, com a configuração de importantes personalidades do cenário político e cultural da Bahia e do Brasil. Nesse setor, a artista plástica tem dado continuidade ao trabalho do mestre Ismael de Barros, que realizou dezenas de bustos, baixos relevos e estátuas, a exemplo dos de Nelson Mandela, José Silveira, Deraldo Motta, Norberto Odebrecht, Geraldo Danemann, Luiz Eduardo Magalhães, César Borges, Simões Filho, Edgard Santos, Pedro Calmon, Dorival Caymmi e (em co-autoria) Vinicius de Moraes. Segue entrevista com a artista.
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FOLHA DA BAHIA - Qual a importância da estátua de Zumbi no conjunto de suas realizações escultóricas?
MARCIA MAGNO – Primeiro é sempre um desafio realizar uma escultura de grande porte, em conseqüência das dificuldades materiais, técnicas, estéticas e operacionais. A importância histórica do herói Zumbi dos Palmares exigiu uma grande reflexão quanto à melhor forma de materializá-lo, criando pela primeira vez a sua identidade física.
F – Qual foi a fonte de pesquisa e referência para o seu projeto plástico na estruturação da figura do Zumbi?
MM – Às informações referentes à etnia sobressai a idéia, a convicção de que Zumbi dos Palmares são todos aqueles que lutaram e lutam pela justiça e pela liberdade. Independentemente de sua origem banto, Zumbi dos Palmares representa a luta de toda uma raça contra a opressão. Procurei pesquisar uma forma que expressasse não apenas um guerreiro atlético, com uma configuração esteticamente exemplar, mas uma figura capaz de simbolizar toda a altivez e a beleza da raça negra. Após pesquisa em vários livros sobre os negros no Brasil e, principalmente, na Bahia, encontramos a forma ideal para representar a posição da figura do Zumbi em estado de alerta, atento a enfrentar qualquer tipo de ameaça. A sua veste, inspirada nas gravuras de Debret, era usada pelos negros do século XVII, feita de tecido rústico, costurada à mão e amarrada na cintura com uma tira de pano.
F – Qual foi o passo inicial dessa pesquisa?
MM - Primeiramente, fui buscar nos livros de história informações sobre a vida atribulada do Zumbi dos Palmares, que nasceu em Alagoas no ano de 1655. Era uma criança de aproximadamente 7 anos quando foi capturado e entregue a um padre católico que o criou, ensinou o latim, o português e a religião católica. Com 15 anos, fugiu e voltou a viver em um quilombo. Tornou-se um líder e um herói na defesa da resistência negra à escravidão.
F – Quais as dificuldades encontradas para você dar forma a um mito?
MM – Tive que pesquisar várias soluções plásticas para obter um resultado que estivesse de acordo com o que havia planejado: a estatura de um grande herói, orgulhoso de sua raça, digno, altivo, em postura de guerreiro, alerta, sempre atento a qualquer sinal de perigo. A escultura deveria expressar, segundo o meu conceito, “movimento em potência”, concentrado.
F – Por que representar o Zumbi com a perna naquela posição, tão incomum?
MM – Nem tanto incomum. Para interpretar a sua vida atribulada em defesa de seu povo, segundo pesquisa fotográfica dos costumes africanos, no livro de Ângela Fisher África Adorned, um livro extraordinário, a perna suspensa do guerreiro apoiada sobre a outra demonstra uma pausa na sua vigilância constante, como também representa uma postura adquirida com a prática da capoeira. Além do mais, não quis dar ao Zumbi uma pose de estátua rígida, empostada, nem cair em lugar comum de ataque ou simulação de luta.
F – Em que você se baseou para configurar as armas do Zumbi?
MM – Isto para mim teve um significado especial. Estive pessoalmente com a ex-diretora do Museu Nocional de Antropologia de Angola e ex-ministra da Cultura Ana Maria Oliveira, com a qual obtive informações contidas no seu livro Angola, que foram importantes contribuições. Do lado direito de Zumbi, na sua cintura, coloquei uma arma denominada gládio ou mukwale, símbolo de poder e atualização do poder vigente. Segundo o livro mencionado, “o conjunto da decoração do cabo representa o chefe tradicional em pé e atento a qualquer circunstancia”.
F – Que técnica e quais os materiais utilizados?
MM – Foi utilizada uma estrutura de fibra de vidro, como auxílio inicial para a modelagem em barro da figura de Zumbi. A concepção da forma física de Zumbi deveria expressar todas as suas qualidades de guerreiro e herói negro. Após dezenas de esboços gráficos e em terceira dimensão com a argila, conquistei nas várias etapas a materialização do corpo idealizado. As modificações foram constantes e gradativas para a obtenção de um conjunto harmonioso e plástico.
Também foi utilizado o modelo vivo como auxílio à realização da escultura. O resultado final foi moldado em fibra de vidro e remetido para a sua fundição em bronze no Rio de Janeiro.
F – Como conseguiu a identidade facial do Zumbi e a expressão de sua fisionomia?
MM – Na verdade, cheguei a modelar quatro cabeças diferentes para a escolha mais apropriada, mais expressiva. Necessitava de uma fisionomia que expressasse inteligência, força, altivez e segurança. Uma fisionomia que também ficasse harmônica com o seu corpo e com a sua idade.
Recentemente inaugurada na Praça da Sé, a escultura de Zumbi dos Palmares, criação de Marcia Magno, vem despertando a admiração de todos pela sua expressividade plástica e simbólica. A repercussão tem chamado atenção para a artista plástica, decoradora e professora da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia. Artista de longo currículo, a sua obra é bastante diversificada e conhecida nacionalmente, através de exposições individuais e coletivas. Já esteve presente em várias mostras internacionais e seu trabalho, é alvo de análise e elogio de renomados especialistas.
Artista da geração 70, tem sido notável a sua presença como professora de arte na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (Ufba), da qual foi diretora e responsável pela criação e implantação dos cursos de desenho industrial e superior de decoração. Na Ufba, também realizou vários murais de grande porte no campus universitário. Ensinando xilogravura, ainda fez parte do grupo de professores das Oficinas de Arte em Série do Museu de Arte Moderna da Bahia, criadas por Francisco Liberato e coordenadas por Juarez Paraíso (marido da artista), de 1980 a 1988.
Na área das artes plásticas, o destaque é para a sua produção de gravuras e, ultimamente, a utilização do computador. Como escultora, Marcia Magno tem se destacado na produção de inúmeras obras personalizadas, com a configuração de importantes personalidades do cenário político e cultural da Bahia e do Brasil. Nesse setor, a artista plástica tem dado continuidade ao trabalho do mestre Ismael de Barros, que realizou dezenas de bustos, baixos relevos e estátuas, a exemplo dos de Nelson Mandela, José Silveira, Deraldo Motta, Norberto Odebrecht, Geraldo Danemann, Luiz Eduardo Magalhães, César Borges, Simões Filho, Edgard Santos, Pedro Calmon, Dorival Caymmi e (em co-autoria) Vinicius de Moraes. Segue entrevista com a artista.
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FOLHA DA BAHIA - Qual a importância da estátua de Zumbi no conjunto de suas realizações escultóricas?
MARCIA MAGNO – Primeiro é sempre um desafio realizar uma escultura de grande porte, em conseqüência das dificuldades materiais, técnicas, estéticas e operacionais. A importância histórica do herói Zumbi dos Palmares exigiu uma grande reflexão quanto à melhor forma de materializá-lo, criando pela primeira vez a sua identidade física.
F – Qual foi a fonte de pesquisa e referência para o seu projeto plástico na estruturação da figura do Zumbi?
MM – Às informações referentes à etnia sobressai a idéia, a convicção de que Zumbi dos Palmares são todos aqueles que lutaram e lutam pela justiça e pela liberdade. Independentemente de sua origem banto, Zumbi dos Palmares representa a luta de toda uma raça contra a opressão. Procurei pesquisar uma forma que expressasse não apenas um guerreiro atlético, com uma configuração esteticamente exemplar, mas uma figura capaz de simbolizar toda a altivez e a beleza da raça negra. Após pesquisa em vários livros sobre os negros no Brasil e, principalmente, na Bahia, encontramos a forma ideal para representar a posição da figura do Zumbi em estado de alerta, atento a enfrentar qualquer tipo de ameaça. A sua veste, inspirada nas gravuras de Debret, era usada pelos negros do século XVII, feita de tecido rústico, costurada à mão e amarrada na cintura com uma tira de pano.
F – Qual foi o passo inicial dessa pesquisa?
MM - Primeiramente, fui buscar nos livros de história informações sobre a vida atribulada do Zumbi dos Palmares, que nasceu em Alagoas no ano de 1655. Era uma criança de aproximadamente 7 anos quando foi capturado e entregue a um padre católico que o criou, ensinou o latim, o português e a religião católica. Com 15 anos, fugiu e voltou a viver em um quilombo. Tornou-se um líder e um herói na defesa da resistência negra à escravidão.
F – Quais as dificuldades encontradas para você dar forma a um mito?
MM – Tive que pesquisar várias soluções plásticas para obter um resultado que estivesse de acordo com o que havia planejado: a estatura de um grande herói, orgulhoso de sua raça, digno, altivo, em postura de guerreiro, alerta, sempre atento a qualquer sinal de perigo. A escultura deveria expressar, segundo o meu conceito, “movimento em potência”, concentrado.
F – Por que representar o Zumbi com a perna naquela posição, tão incomum?
MM – Nem tanto incomum. Para interpretar a sua vida atribulada em defesa de seu povo, segundo pesquisa fotográfica dos costumes africanos, no livro de Ângela Fisher África Adorned, um livro extraordinário, a perna suspensa do guerreiro apoiada sobre a outra demonstra uma pausa na sua vigilância constante, como também representa uma postura adquirida com a prática da capoeira. Além do mais, não quis dar ao Zumbi uma pose de estátua rígida, empostada, nem cair em lugar comum de ataque ou simulação de luta.
F – Em que você se baseou para configurar as armas do Zumbi?
MM – Isto para mim teve um significado especial. Estive pessoalmente com a ex-diretora do Museu Nocional de Antropologia de Angola e ex-ministra da Cultura Ana Maria Oliveira, com a qual obtive informações contidas no seu livro Angola, que foram importantes contribuições. Do lado direito de Zumbi, na sua cintura, coloquei uma arma denominada gládio ou mukwale, símbolo de poder e atualização do poder vigente. Segundo o livro mencionado, “o conjunto da decoração do cabo representa o chefe tradicional em pé e atento a qualquer circunstancia”.
F – Que técnica e quais os materiais utilizados?
MM – Foi utilizada uma estrutura de fibra de vidro, como auxílio inicial para a modelagem em barro da figura de Zumbi. A concepção da forma física de Zumbi deveria expressar todas as suas qualidades de guerreiro e herói negro. Após dezenas de esboços gráficos e em terceira dimensão com a argila, conquistei nas várias etapas a materialização do corpo idealizado. As modificações foram constantes e gradativas para a obtenção de um conjunto harmonioso e plástico.
Também foi utilizado o modelo vivo como auxílio à realização da escultura. O resultado final foi moldado em fibra de vidro e remetido para a sua fundição em bronze no Rio de Janeiro.
F – Como conseguiu a identidade facial do Zumbi e a expressão de sua fisionomia?
MM – Na verdade, cheguei a modelar quatro cabeças diferentes para a escolha mais apropriada, mais expressiva. Necessitava de uma fisionomia que expressasse inteligência, força, altivez e segurança. Uma fisionomia que também ficasse harmônica com o seu corpo e com a sua idade.
Saudações!
ResponderExcluirA homenagem e a conseqüente reportagem estão muito boas, mas não se consegue, nem com uma pesquisa mais forte na Internet encontrar a foto da estátua. Inclusive na reportagem há um detalhe especial sobre as posições da perna de Zumbi a qual a artista justificou de maneira bastante interessante. Seria também interessante que pudéssemos visualizar a imagem já que muitos não podem viajar até Salvador para vê-la pessoalmente.
Abraços,
Robson Nogueira - Solo!