sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Movimento negro cobra de secretaria "efeitos práticos"

Ainda que reconheçam importância da Igualdade Racial para discutir a discriminação no país, especialistas vêem falta de ações

Criada em 2003, pasta é uma espécie de órgão simbólico da Presidência, com baixo orçamento e pequena autonomia


EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FONTE: FOLHA DE SÃO PAULO

Com um Orçamento enxuto e prestes a completar cinco anos, a Seppir (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) da Presidência da República não tem condições de caminhar com as próprias pernas, atuando basicamente como órgão simbólico e de sugestões na estrutura da União. Mesmo que proponha ações, ela depende da aprovação do Planalto e de parcerias com outros ministérios, em especial Saúde, Educação e Desenvolvimento Agrário.

De acordo com especialistas e integrantes de movimentos sociais ouvidos pela Folha, a criação da Seppir foi importante para trazer à tona o tema da discriminação racial no país, mas que tal simbologia não tem surtido o efeito prático esperado em políticas para os negros.

"Na prática mesmo a secretaria não tem significado quase nada. Ela tem sido usada como um símbolo, mas um símbolo muito vazio. Têm faltado ações de verdadeiro impacto e competência técnica para a secretaria e ao governo para fazer o que tinha de fazer", afirma Jurema Werneck, coordenadora da ONG Criola.

A secretaria foi criada em março de 2003 por pressão do movimento negro, três meses após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No ano passado, por exemplo, teve orçamento de R$ 34 milhões.

"Há muita confusão sobre a missão da Seppir, por isso poucos enxergam que muitas das ações nos ministérios partiram da secretaria. Quanto a recursos, sempre há necessidade de mais dinheiro", disse Martvs das Chagas, secretário-adjunto da ministra Matilde Ribeiro.

Uma das críticas à Seppir está na lentidão das redes de ensino em cumprir a Lei 10.639, de janeiro de 2003, que obriga as instituições a incluir o tema da história e da cultura afro-brasileira nos currículos."

A Seppir é culpada, ela tem que implementar a lei. Ela tem que fazer o MEC [Ministério da Educação] cumprir essa lei. Na prática, essa lei não foi implementada. O MEC e a Seppir estão fazendo vistas grossas para isso", afirma Edgard Moura Amaral, secretário nacional de formação dos agentes pastorais negros do Brasil.

Uma das principais bandeiras atuais do movimento negro é o Estatuto da Igualdade Racial, que estabelece sistema de cotas raciais para diferentes setores e continua parado no Congresso. A Seppir, porém, sem força, negocia sozinha com deputados e senadores, sem a intervenção do Planalto com os partidos da base aliada.

Esse isolamento tem preocupado os movimentos. "É necessária uma maior estrutura e uma maior dotação orçamentária à Seppir", afirma Marcus Alessandro Mawusí, coordenador nacional do MNU (Movimento Negro Unificado).

"Saímos do estágio que estávamos adormecidos e agora queremos que as políticas públicas sejam implementadas com mais rigor. É preciso um melhor orçamento e ser mais arrojado com os quilombos, com os títulos nas mãos", completa Moura Amaral.

No governo Lula, uma das principais conquistas atribuídas à secretaria foi a publicação, em novembro de 2003, do decreto presidencial que regulamentou o procedimento de reconhecimento e demarcação de terras ocupadas por remanescentes de quilombos.

"A idéia inicial é que o diálogo da Seppir com ministérios pudesse resultar em políticas em cada uma das áreas. Efetivamente a gente ainda não viu isso ocorrer", afirma o professor Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da UnB.

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